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sábado, 23 de abril de 2011

Aquaman #1


Aquaman #1

A estréia de nosso novo autor Gabriel Guimarães
Imperdível!
 




O metal range muito. Por mais que eu esteja acostumado com viagens em aviões de condições precárias, o “Plato” deve ser o pior modelo no qual já viajei na vida. Os parafusos parecem tremer a cada solavanco com o vento.

- Qual o problema, Tom? Tá com medo de uma chuvinha dessas?

- Uma chuvinha dessas já causou três acidentes na costa com navios cargueiros e proibiu a decolagem de qualquer avião dos aeroportos litorâneos da Flórida, Ben. Teremos sorte se sobrevivermos pra chegar em terra firme.

Eu suo, olhando pela janela quebrada no meio da porta de entrada do avião. Penso que jamais deveria ter entrado num avião clandestino só pra chegar nos laboratórios Star mais rápido, mas essa equipe de biólogos não consegue ter paciência para esperar a chuva passar. Se bem que toda essa água e vento forte batendo contra o avião e os relâmpagos ensurdecedores ao nosso redor fazem isso tudo ser mais uma tempestade do que uma mera chuva de verão.

- Meu doutor, colega de profissão, amigo e fiel camarada, qual é o problema? Terra firme não ta com nada... – diz Ben, na sua voz esganiçada e irritantemente convencida - O mar tem mais história, mais vida e mais potencial que qualquer coisa que você possa achar na superfície. Basta você abrir os olhos e ver. Eu quero mais é o mar mesmo.

E eis que um estrondo passa tão perto que nos desnorteia, jogando toda a tripulação, com seus técnicos marítimos e equipe de mergulhadores contra uma das paredes da aeronave. Um relâmpago acabara de nos tirar metade da asa direita. Há muitos gritos ao meu redor. Eu vejo Cíntia e seus dois estagiários correm para pegar os coletes salva-vidas, mas não há tempo suficiente para isso. O avião gira e nossa referência do horizonte agora está completamente perdida. A colisão com a água é iminente, e não tarda a acontecer, num impacto tão intenso que fica claro que nenhum dos pilotos sobreviveu.

A couraça do avião se racha, e a água entra por todos os lados. Não vejo mais ninguém comigo, nem Ben, nem Cíntia, nem os estagiários. Ninguém.

Nado o mais rápido que posso, desviando das ferragens e luto contra a pressão em meus ouvidos e dentro da minha cabeça para chegar à superfície. Minha respiração é ofegante, mas não posso puxar muito ar, senão engulo água suficiente para bloquear meus pulmões. Ainda assim, me esforço para gritar por socorro, mas no meio do mar, quem poderia surgir para vir em meu encalço? O capitão Nemo está longe demais dentro do seu confortável Náutilo para ouvir meu pedido de ajuda. Não importa, é tarde demais. Vejo uma onda com talvez o dobro do meu tamanho vindo em minha direção. Tento me convencer de que há uma esperança, mas não sei de onde, apenas um milagre poderia me salvar. Se apenas eu tivesse força para manter-me acordado até a onda chegar, talvez pudesse tentar desviar da onda... Talvez pudesse sobreviver por mais alguns instantes, antes da água me engolir como nada mais que um grão de areia na praia. Não sei, talvez...


***

A escuridão inunda minha visão. Será que estou morto? Como será que aconteceu, de fato? Tive forças para lutar contra a onda que vinha contra mim e morri por falta de ar ou o impacto da onda foi o suficiente para tirar-me a vida? Se morri, onde estou? Tudo que ouço é o som de água. Espere! Se ouço água, pode ser que esteja vivo, que tenha conseguido chegar à maré de Lauderdale levado pelas ondas. Mas por que não sinto a areia no meu rosto?

Preciso abrir os olhos, preciso lembrar o que aconteceu, saber onde estou.

Entre pesadas piscadas, os tons verdejantes de onde quer que eu esteja começam a ganhar um pouco de nitidez, porém, não pareço estar numa ala hospitalar ou em algum centro de atendimento médico. Onde...?


***

- M-me-meu Deus...

Quando dou conta de mim, percebo que estou coberto por uma manta aquecida em meio a lençóis numa cama como as da realeza britânica que você vê em revistas e livros de história. Devo estar sonhando. Ou então delirando. Qualquer uma dessas hipóteses soa viável. Pilastras como as da antiga Grécia se prostram em cada extremidade do cômodo, com adornos em todo o seu redor. As paredes têm um tom meio esverdeado, como de uma estrutura histórica que foi corroída por alguma infiltração ou pelo tempo, simplesmente.

Apesar de estar ainda maravilhado com a estrutura desse lugar, preciso saber exatamente onde estou. Saber se há notícias dos outros passageiros do “Plato”. Talvez haja alguém lá fora, só preciso abrir um pouco essas cortinas, que parecem tão sensíveis ao toque da mão como uma corrente de vento pelo ar e...

- Água! Mas como pode? Só há água do lado de fora! Isso tudo não pode ser real. Eu preciso buscar ajuda...

Caminho na direção da porta, branca com pequenos desenhos dourados com relevo maior, e giro a maçaneta calmamente. Afinal, o que mais pode me esperar do lado de fora?


***

A porta não range, o que é estranho, já que geralmente nos prédios históricos, as estruturas de sustentação das portas e janelas costumam deteriorar-se muito rápido ao ar livre. Mas o que estou dizendo? Ar livre? Eu acabei de ver água pela janela! Preciso saber onde estou!

- Alô? Tem alguém aí?

O silêncio faz minha voz ecoar e chegar de volta aos meus ouvidos.

- Eu sofri um acidente no avião onde estava com uma equipe de biólogos e depois que nós caímos no mar, não me lembro de mais nada!

De novo o silêncio.

- Alguém pode me ajudar? Eu preciso de ajuda agora! – meu coração começa a acelerar, e no desespero, começo a correr pelo corredor imenso, sóbrio e vazio - Onde estou? Onde estão todos? Por que não me respondem? Alguém me responda!

É nesse momento que o eco volta com toda força e meus ouvidos parecem que vão explodir. Eu caio rapidamente no chão, me contorcendo de dor. Devo estar prestes a romper um tímpano, ou então ter um sério problema no labirinto dos meus ouvidos.

- Acalma-te, por favor. – diz uma voz vinda de trás de mim. Seu tom suave praticamente passa desapercebido, já que meus ouvidos parecem inchados e com muito acúmulo de sangue – Deixa-me cuidar de ti.

As mãos de quem quer que tenha chegado encostam em minha cabeça, como procurando um ponto específico para tocar. Sequer tenho como reagir, estou simplesmente desmoronado no chão, em agonia.

- Torna-te a maré, suave, gentia, de águas serenas. – começa a cantar, em um tom melódico, quase hipnótico, mas que começa a fazer a dor parar. – Torna-te o mar, oceano de vida abundante, onde não há problemas. Torna-te a água, límpida, cristalina. Assuma a vida, que em ti se denuncia.

Quando a música para, me sinto como não sentia em anos, talvez décadas. Meu corpo está com cada músculo, antes retesado, agora solto, desarmado, sem qualquer pressão.

- Sente-te melhor? – diz a voz de minha salvadora, ainda com um tom de voz tão pacífico que é quase difícil de perceber que preciso responder algo.

- S-sim. O que aconteceu?

- As estruturas do Palácio possuem características muito sensíveis ao som. Teus gritos ecoaram nas paredes e no teto de uma forma que retornaram aos teus ouvidos em um nível muito maior do que o ouvido de um ser da superfície consegue suportar.

- Alguém da superfície? Como.. – me viro para observar a mulher bondosa que me salvara, porém, meu susto torna a tirar a paz que meu corpo alcançara. Sua face, apesar de se assemelhar a das outras mulheres que já conheci, demonstra ter uma textura semelhante à dos seres marinhos aos quais dediquei tantos anos dos meus estudos como biólogo e do tempo em que trabalhei como faroleiro – Aaah!

- Acalma-te. Não queiras sofrer do mal de que eu acabara de te recuperar.

Seu toque, agora pude perceber, também demonstrava ter a textura que seu rosto possuía. Não sei exatamente de onde, mas olhando para ela, pensei se ela não seria como uma das sereias mitológicas de que as lendas européias tanto falavam.

- Eu sou Atlanna, princesa da Família Real do Império Atlante. Tu, ser da superfície, estavas prestes a sucumbir ao impacto de uma Tritowe, quando eu te puxei para a profundeza do mar até aqui.

- Tritowe? Atlântida? Não estou conseguindo entender...

- Tritowe é como nós chamamos ondas grandes no nosso dialeto atlante. Tu estás agora entre as paredes do Palácio Real do Império Atlante.

- Mas, como isso é possível? Atlântida é uma lenda!

- A Atlântida sucumbiu à fúria das nações que a invejavam há muitos milênios atrás, se estabelecendo no fundo do mar graças aos esforços do Rei Poseidon, que governava a cidade nos tempos obscuros e construiu a cúpula onde vivemos por tanto tempo e ainda vivemos hoje.

- Cúpula?

- Sim, o Império Atlante é envolvido por uma cúpula que possui uma mistura no ar perfeita entre o ar da superfície e o ar dentro da água do fundo do mar. É por isso que você pode respirar aqui embaixo e eu também. O Rei Poseidon acreditava veementemente que o povo atlante poderia viver em harmonia com o povo da superfície, e a cúpula seria o ambiente onde seu sonho poderia se tornar realidade.

- E por que isso não aconteceu?

- Nós tentamos muitas vezes nos aproximar dos povos da superfície, mas o resultado era sempre devastador para a população atlante. O último grande esforço para tornar esse sonho real aconteceu na era dos grandes navios de seres que se denominavam vikings. Nenhum dos atlantes enviados na missão de paz retornou para seu lar aquele dia. E desde então o povo passou a odiar os homens da superfície, e o sonho de Poseidon morreu.

- Mas isso foi há séculos atrás... Muito mudou desde então. É claro que eu não posso afirmar com certeza qual seria a reação de algumas pessoas lá em cima agora, mas pode ser que ainda haja uma chance.

- Não podemos arriscar. Ainda há muita objeção ao simples pensamento de subir até o limite entre a água e o ar. Eu sou a única que desafia as ordens do Conselho Real e nada até a superfície para observar o céu. Em Atlântida nós não temos isso, e é talvez isso que eu mais invejo no povo da superfície.

- Lá, eles não são muito diferentes do que você diz que os atlantes são aqui. Há muito preconceito, medo e pavor do desconhecido. Mas, mesmo séculos depois, os atlantes ainda remoem o que lhes foi feito?

- O ar que existe na cúpula faz com que o metabolismo celular atlante seja mais lento e mais seguro, dando-nos maior longevidade e proteção contra ameaças de microorganismos externos.

- Tem só mais uma coisa que eu não entendo. Como é possível estarmos nos comunicando assim? Se vocês são um povo tão antigo no mundo, como pode falar inglês comigo?

- No Império Atlante, todos os habitantes aprendem todas as línguas do mundo a partir de artefatos históricos que estão em nossa Biblioteca Real. Lá, há textos do surgimento de praticamente todas as nações do planeta, e até elementos da atualidade que eventualmente algum de nós consegue encontrar. Falando nisso, perdoa-me se erro na pronúncia ou no uso de algumas palavras, mas a língua que tu falas é deveras diferente da língua inglesa que aprendi tempos atrás.

- Não, tudo bem. Você fala muito bem minha língua, apenas usa muito a segunda pessoa do singular para falar de mim. Isso já deixou de ser usado há décadas na superfície. Mas isso não é problema algum, entendi tudo que você disse.

- Fico feliz.

- Atlanna, mas como você soube que eu falava inglês?

- Quando encontrei-te após teu acidente, li no avião onde tu voavas palavras em inglês.

- Entendi. Será que eu poderia conhecer a Biblioteca Real de que você falou? Eu estudava as formas de vidas marinhas quando estava na superfície, tendo milhares de dados sobre a fauna marinha a partir do que podemos ver na parte mais próxima da superfície do mar, porém, nem imagino a quantidade de informações que vocês não devem ter.

- É preciso ir com cautela. O povo atlante e, principalmente, a Guarda Imperial, não vêem com bons olhos a tua raça. E, caso o vejam, não há como eu salva-lo novamente.

- Eu compreendo, Atlanna. Mas estou disposto a correr esse risco.

- Então vamos, ser da superfície. É uma jornada pela qual nenhum ninguém de sua raça passa em séculos.

- Desculpe, esqueci de me apresentar também. Não precisa me chamar de ‘ser da superfície’, meu nome é Thomas Curry, mas pode me chamar de Tom.


***

Podem me considerar um louco por avaliar o grau de evolução de uma cultura pelo modo como ela opera o seu conhecimento mais do que pelo modo como ela mantém a estrutura dos seus locais históricos e expande seu domínio tecnológico, mas a visão que tive ao adentrar os largos portões atlantes e me deparar com uma quantidade de artefatos históricos, catálogos e livros que deixariam qualquer biblioteca nacional de qualquer país do mundo numa posição tão inferior que pareceriam meros neandertais olhando para uma das naves Apollo, me deixou simplesmente sem palavras.

Centenas de prateleiras, preenchidas por centenas de livros, cada qual com milhares de páginas, que vinham de culturas de séculos, milênios atrás e que jamais haviam sido divulgados aos olhos da mídia da superfície, agora estavam à minha frente. Eu não sabia por onde começar, mas Atlanna sim.

- Neste livro, tu encontrarás as informações sobre os últimos encontros entre os seres da superfície e os atlantes.

- Mas como eu vou conseguir lê-lo? Ele está escrito na sua língua. Por mais que você compreenda o que eu falo e o que eu posso escrever, eu não tenho como fazer esse processo no outro sentido.

- Não te preocupes. Eu ensinar-te-ei.


***

Já faz semanas que estou aqui. Atlanna tem me ensinado tudo sobre a cultura atlante e como é a vida nas profundezas do mar. Nunca comi tanto fruto do mar como nesses dias aqui. Apesar de nunca ter me imaginado como alguém que precisasse se esconder para não ser visto por outros, como um fugitivo da prisão, houve momentos em que eu precisei me desdobrar para não ser visto por alguns guardas do Império quando iam fazer a ronda na Biblioteca Real. Mas tudo valeu a pena. Por causa dela.

Atlanna tem se tornado cada vez mais que uma mera companheira exploradora. Cada vez que eu lhe ensino algo sobre a superfície e ela me ensina algo sobre o oceano, sinto como se tivéssemos um vínculo além do que palavras podem descrever. É como se pudéssemos falar sem dizer nada, quase como uma telepatia. Ela diz que os atlantes têm uma sensibilidade neural muito desenvolvida, o que lhes permite realizar algumas ações em seu ambiente natural ou mesmo entre eles, mas nada como o que nós temos. Ela fala que foi apenas graças a esse elo inexplicável que ela conseguiu realizar o controle da pressão interna do meu corpo enquanto nadava em direção à Atlântida comigo após o acidente.

Eu não sei explicar de forma muito racional isso, mas eu não preciso. Tudo de que preciso é dela.

- Tom, você é louco.

- Por quê, Atlanna?

- Você não pode se revelar ao povo atlante. Eles o matarão em praça pública.

- Mas eu já me decidi. Não há nada para mim na superfície. Tudo que eu quero é viver aqui no Império com você. Se é preciso assumir o risco de minha própria morte para isso, que assim seja!

- Tom, pelo menos, espere. Há algo que preciso lhe contar.

- O quê aconteceu? Está tudo bem com você?

- Melhor do que jamais esteve. Hoje, há uma ligação ainda maior entre nós do que jamais houve, e ela está viva dentro de mim. Eu sinto.

- V-você está grávida?

- Sim.

- Mas isso é uma notícia maravilhosa! Precisamos comemorar!

- Sim, comemoraremos. Mas prometa-me que não tomará nenhuma atitude impensada antes de nosso filho nascer. Ele precisará de um pai, e sei que você é o melhor candidato para isso.

- Tudo bem, Atlanna. Esperarei por um momento propício. Nada há de nos separar. E, se Deus quiser, este nosso filho representará o elo que nós e o Rei Poseidon tanto sonhamos para gerar uma união pacífica entre a profundeza atlante e o povo da superfície. Ele se chamará Arthur, em homenagem a um rei que certa vez uniu muitos povos diferentes em prol do bem maior para todos.

- Assim espero, querido.

- Sim, ele trará mais boas novas à Atlântida do que jamais poderíamos imaginar. E, sendo assim, ele será o nosso novo e pequeno rei Arthur.



CONTINUA.

4 comentários:

  1. Muito bom rapaz, parabéns!

    Ancioso pelo próximo.

    abç.

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  2. Olha só! E eu estava me perguntando onde estaria o aquaman na parada, ehehehe #ignorante. Muito legal a história, parabéns, e já adicionei o blog ao meu RSS reader.

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  3. Nossa,gostei mesmo,ansiosa pela próxima,seja bem vindo a DC Ultimate e se precisar de ajuda com os desenhos estarei por aqui \o/

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  4. Que bom que gostaram! Desculpem a demora em responder os comentários, mas tudo tem estado muito corrido nesse mês...
    Bruno: Já está online! Só conferir!
    Fábio: Na segunda edição que já está online você já vai encontrar o personagem lá. =)
    Mariana: Vlw mesmo pela disposição! Qualquer coisa que eu possa precisar, pode deixar que entro em contato com você! Espero que curta a continuação da história! =D

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