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sábado, 14 de maio de 2011

Mulher Maravilha #2


Mulher Maravilha - A Queda #2
As Tecelãs

Por Daniel Násser

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Uma grande escuridão se acerca do mundo e desta escuridão nada se distingue, além de olhos vermelhos e cruéis a observá-la empunhando uma espada que nunca vira, até que a risada de uma mulher rompe o silêncio e ela se vê caindo na escuridão, mergulhando cada vez mais profundamente, se perdendo, se perdendo, se...

Diana desperta aos gritos e coberta de um suor frio. Vê-se deitada num leito confortável, envolta em lençóis brancos, travesseiros macios, uma jarra de água sobre o criado mudo. Refresca sua garganta e respira fundo um instante. O quarto ainda parece estar suspenso no seu terror, uma quase escuridão repleta de coisas que não são suas e lembranças de outra. Apanha uma fotografia próxima. Quem será essa linda moça de cabelos cor de ouro?

- Você está bem? – a voz gentil surge da fresta de luz deixada pela porta agora semi-aberta.

Diana observa um instante, a estranheza da cena logo se desfaz e ele reconhece à senhora que a ajudara na noite anterior. A amazona esboça um sorriso e responde meio sem jeito:

- Pesadelos...

- É, eu percebi. – Julia Kapatellis vai adentrando o quarto, senta-se na cama ao lado de Diana e segura sua mão – Acalme-se. Sonhos não podem nos fazer mal. Tudo são coisas de nossa mente.

- De onde eu vim, sonhos são bem mais que isso. – os olhos dela ficaram vítreos – são presságios do amanhã...

Julia apertou sua mão, como se a chamasse de volta ao mundo real.

- E de onde você vem, querida? – perguntou ela – Quem é você de verdade?

A amazona baixa os olhos, agora vendo a realidade a sua volta e diz:

- Eu não sei...

O elevador sobe lentamente, suas engrenagens rangem. Vanessa Kapatellis odeia esse elevador desde que se mudou pra cá muito criança e acha que nunca vai deixar de odiá-lo, mesmo depois de ter partido para um apartamento mais confortável.

- Quando vai se mudar desta pocilga, mãe? – Vanessa sussurra para si mesma.

Vanessa apanha as suas chaves dentro da bolsa e percorre os olhos pelo apartamento, após ouvir o rumor de vozes.

- Mãe? – chamou ela, aproximando-se de seu antigo quarto, de onde provinham as vozes.

Julia sai do quarto, encostando a porta atrás de si.

- Vanessa. – diz sem jeito – Você não me disse que vinha hoje...

- E preciso avisar com antecedência quando vou estar na casa da minha mãe? – disse, e a ironia escorreu de seus lábios rubros – Não sou bem-vinda?

- Sim, é minha filha.

- Está escondendo o quê no meu velho quarto? - Vanessa avança sobre sua mãe, buscando a fechadura da porta – Com quem você falava?

- Querida, espere...

Mas antes que pudesse dizer qualquer coisa Vanessa avançou quarto a dentro e viu Diana deitada em sua cama, a encará-la com simplicidade.

- Quem é essa? – disse Vanessa, sua voz repleta de raiva – O que ela faz aqui?

Julia baixa a cabeça, sem nada dizer a princípio.

- Ela precisava de ajuda...

- E agora você vai trazer para casa todos os sem-teto que encontrar precisando de ajuda? – ela grita. Sua saliva atinge o rosto de sua mãe – Todos precisam de ajuda. O mundo inteiro precisa de ajuda. Não se pode ajudar todos. Você é uma professora de história clássica na Universidade, ganhando uma miséria que mal dá pra se sustentar, vivendo neste ninho de ratos, sem outro futuro para se esperar, além da morte. Não pode ajudar nem a si mesma.

Diana se põe entre Vanessa e Julia e sua figura imponente ergue-se como um muro entre elas.

- Devia respeitar sua genitora, mulher. – a voz de Diana era firme, mas ainda possuía graça – Ela lhe deu vida e sofreu para isso. Devia conter suas palavras.

- E você quem é? – grita Vanessa – A deusa da Verdade?

As três permanecem estáticas por um instante mínimo que parece eterno.

- Esquece! – Vanessa quebra o silêncio – Minha mãe sempre teve mais atenção com os mendigos da rua que a mim...

- Isso não é verdade!

Vanessa sai batendo a porta com força.

- Vanessa! – grita Julia, mas não há resposta.

Diana põe a mão sobre o ombro de Julia e o aperta carinhosamente.

- Não queria causar nenhum transtorno. – disse a amazona – Talvez eu deva partir...

- Não, minha filha. Por favor, fique. – Julia diz entre soluços – Minha Vanessa sempre foi assim, rebelde. Desde a morte de seu pai Niklos, acha que o mundo conspira contra ela. Deixe-a ir. Ela esfria a cabeça e volta.

- O destino possui outras urgências, princesa. – uma imagem como feita de luz e fumaça surge na frente de Diana e Julia – O tempo dos Olimpianos se esgota, amazona. Só você possui a chave pra nossa libertação. O laço te revelará a verdade, quando encontrares as moiras. Elas poderão devolver suas lembranças e verdadeiro eu.

- Como as encontrarei?

- Voe seguindo seu laço, ele será seu guia. – Atena cai sob um dos joelhos – A verdade é sempre um guia.

Diana despede-se de Julia assim que figura de Atena se desfaz no ar como fumaça e lança-se pela janela em meio ao céu noturno iluminado pelo neon e outras ilusões. O laço emite um brilho d’ouro à medida que se aproxima de uma certa área da cidade: Hollywood Boulevard, uma famosa avenida localizada no bairro de Hollywood indo da Sunset Boulevard, no leste, até o noroeste, Avenida Vermont. Um local repleto de teatros grandiosos e prostitutas de luxo que caminham sob a estrelada calçada da fama.

O laço brilha como ouro vivo quando Diana sobrevoa um prédio enorme, então ela desce e para em frente às majestosas portas. O Grauman’s Chinese Theatre, inaugurado em 1927, tinha ao largo de sua fachada a calçada da fama e seus nomes estelares. Sua entrada em estilo chinês transporta um estrangeiro pra o oriente e para outra cultura.

- Bem, parece que é aqui... – Diana não se sente segura. Há um poder enorme naquele lugar, algo maior do que homens ou deuses. O recinto está completamente escuro, a Mulher Maravilha caminha a passos firmes, porém contidos. No fim de um enorme corredor escuta um barulho familiar, como uma roca a tecer um fio. Caminha naquela direção e vê um enorme palco, muitas cadeiras vazias e uma lúgubre luz a iluminar três figuras: Sob a mesa um lampião bruxuleante a espalhar sua luz morta sob o palco. Uma velha senhora segura à roca, uma mulher tece o fio e uma menina segura um tesoura dourada e corta o fio tecido.

- Você já era aguardada, Diana de Themyscira. – disse a mais velha e sua voz era desagradável, como metal contra metal.

- Vocês sabiam que eu viria?

- Sabemos sempre. – disse a mulher, uma voz mais agradável – Sabemos de tudo, inclusive o que a trouxe aqui, princesa das amazonas.

- Vocês são as Moiras?

A mais jovem meneia a cabeça e Diana percebe pela primeira vez que não possui olhos.

- Nada mais diga, Diana de Themyscira, pois agora lhe mostraremos coisas que vão além dos conhecimentos dos mortais, que os fariam tremer dentro de suas peles e morrer de pavor.

A voz da anciã soava mais terrível. Ela prosseguiu:

- Láchesis, traga o olho.

A mulher conhecida como Láchesis caminhou até um canto do palco onde apanhou dentro de um baú uma esfera escura, observou-a por um instante e a ergue.

- Aqui esta o Olho do Destino, Klothó.

- Inicie o ritual. Entregue-o a Átropos.

Láchesis entregou a esfera negra a jovem sem olhos e ela reluziu, saindo de sua mão e alcançando o ar, aquecendo o ambiente, explodindo num vórtice de cores e imagens sem sentido a princípio.

- Princesa, esta é a jornada divina a qual você foi destinada. Você, Diana, nasceu numa ilha perdida entre o mundo dos homens e dos deuses, chamada Themyscira. Feita do barro da ilha sagrada por sua mãe, Hypolita, rainha das amazonas, você já cresceu destinada a fazer os Olimpianos darem um novo salto em sua estória. Numa guerra antes do tempo dos homens Cronos destronou seu pai Urano e se tornou soberano do universo, bem como seu filho Zeus o destronou e assumiu seu reinado junto com seus irmãos. Geração após geração Zeus governou até que uma feiticeira chamada Circe, inconformada com os rumos do mundo dos mortais e sua decadência, lançou um poderoso feitiço libertando Cronos e seus irmãos do cárcere e iniciando uma sangrenta guerra com os deuses do Olimpo, que culminou com seu aprisionamento e um reinado de horror iniciado pelos Titãs. O mundo vai mudar em breve, assim que os portões que o separam da magia divina cedam. E logo cederam. Você guerreou com os olimpianos amazona, mas viu sua ilha cair em desgraça e sua irmãs serem feitas de escravas, antes de ser lançada ao mundo dos homens por sua protetora, Palas Atenas. Traz consigo o laço da verdade, o guia para encontrar um objeto sagrado perdido na terra e que pode pôr fim a esta guerra e restabelecer os Olimpianos a seu lugar: a Espada Eterna. Mas para tomar posse da espada deverá enfrentar um mal terrível que repousa num labirinto de onde nem mesmo ele pode encontrar a saída. Parta agora, amazona, encontre o lar de Asterion e resgate a espada, ponha fim à guerra e dê aos deuses seu novo soberano.

Neste instante a voz que saia da esfera agora iluminada cessa. O ambiente torna-se mais quente, é então envolvido num clarão gigantesco e quando se desfaz, Diana encontra-se só. Para por um instante e pensa: “Como encontrarei Asterion?”. Seu laço começa a brilhar revelando a ela que novamente seria seu guia.

Julia kapatellis está preocupada com Diana. Sua jornada parece ser perigosa e parece que suas conseqüências se refletirão no mundo dos homens. Ela sente isso em sua alma. Esta nervosa, tensa. E neste instante seu celular toca.

- Já mandou esta indigente sair da sua casa, mãe? – Vanessa grita ao volante, enquanto apóia o celular no ombro.

- Cale-se, Vanessa. – Julia perde a paciência por um momento, mas era o bastante pra recomeçar a velha discussão. – Esta casa é minha, não sua.

- Por que me espantar, se você claramente prefere dar atenção a uma estranha... – Vanessa faz uma ultrapassagem perigosa, sem perceber que um carro viria de encontro ao dela. O veículo rola pela ribanceira da estrada e Vanessa grita ao celular. Julia escuta seu desespero e também grita, sente a dor em sua alma, mas o que pode fazer, além de ouvir sua filha? O ranger do metal de súbito para. O carro finalmente parou.

- Mãe, me ajuda... – Vanessa murmura antes de perder a consciência.

CONTINUA...



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