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sábado, 26 de março de 2011

Flash #1

 

Flash #1 - Através do Espelho
Parte 1 - Fragmentos

Escrito por Daniel Násser


 
Norte da Escócia. O frio parece refletir nas almas da pessoas uma solidão imensa. Não é diferente em Aberdeen, a cidade do granito. Não possui uma grande população, mas é um ponto de ligação extremamente importante com as plataformas de petróleo do mar do norte. Fundada no ano de 700 depois de Cristo, a cidade foi incendiada pelos ingleses em 1336 e ocupada por tropas do parlamento inglês em 1651, e nessas idas e vindas a cidade permaneceu meio morta para o mundo. Mas algumas vezes, apesar do frio, os corações das pessoas se aquecem e isso se revela em pequenos gestos. A senhora Eve McCulloch possuía um orfanato onde abrigava as pequenas almas abandonadas em sua cidade. Jamais se negou a dar o pouco que tinha a seus filhos adotivos. Mas num lar onde convivem tantas crianças, por mais atenção que se tenha, não se pode ficar sabendo de tudo. O jovem Evan chegou ainda recém-nascido a sua porta, não trazia nada, a não ser uma foto de seus pais (dois estranhos para Senhora McCulloch) e um largo sorriso no rosto. Talvez tenha sido isso o que mais encantou Eve, a ponto de lhe dar um nome tão próximo ao seu. Evan sempre fora muito próximo dela e de todos ao seu redor e sua infância foi muito feliz, até a chegada de Georgie Gordon. Era bem mais velho que os outros, mas também ficara orfão recentemente e a senhora McCulloch não podia se negar a recebê-lo. Desde o início ele tentava de todas as formas tornar a vida de Evan miserável. Talvez a proximidade de Evan com a dirigente do orfanato o incomodasse, talvez... Evan evitava encontrá-lo, sentar-se próximo,assistir as mesmas aulas, mas ainda sim era perseguido por Georgie.

E numa noite fria, como tantas outras, tudo iria mudar.

            A senhora McColloch chamava as crianças para dentro, já não era mais hora de brincar. Todos retornaram, menos Georgie e Evan. Ela já demonstrava a preocupação com os hematomas que iria cuidar em seu querido Evan e já pensava em como iria castigar àquele garoto terrível. Mas nenhum dos dois jamais retornou.

            Próximo ao pequeno córrego de água suja Evan evita que Georgie o visse, pois este o procurava e gritava por ele à horas, caçoando e rindo sozinho de suas próprias piadas.

- Vem cá, Evan. - gritava Georgie – Tenho uma coisa que você vai gostar.
       
     Evan tremia e rezava para que ele não o encontrasse. Deus não o escutou.
- Achei você!

            Evan gritava enquanto Georgie o batia e arrastava pelo chão de terra.

- Me solta, Georgie! - gritava alto – eu vou contar tudo a senhora McCulloch!

- Com o que eu vou te dar você não vai contar a ninguém!

            Georgie puxou sua calça para baixo e revelou suas intenções para com o jovem Evan, que se debateu com força e gritou mais, só que ninguém ouvia. Em seu desespero, Evan lançou mão do que alcançou e o agrediu com uma pedra. Georgie caiu, sua cabeça encharcada de sangue. Evan se assustou por um momento. O que havia feito? Não importava. Arrastou o corpo de seu agressor até o riacho de água barrenta e soltou-o para ser devorado pelos peixes. 

- Parabéns. - disse uma figura envolta num capuz que observava tudo em silencio até aquele momento – Não esperava menos de você.

- Quem é você? - Evan saltou assustado.

- Só um amigo. Seu único amigo, na verdade. Porque depois disso tudo, acha que Eve McCulloch ainda vai lhe querer entre os seus?

             Evan baixou a cabeça.

- Mas você é um bom garoto. - continuou o desconhecido – E vai ser muito útil pra mim no futuro. Um futuro não tão distante. Só precisa aprender uns truques. E vai aprender.

            O estranho tocou a cabeça do jovem Evan e sua mão vibrou um instante através de seu cérebro deixando-o desacordado por uns instantes.

- O que você fez comigo? - Evan parecia drogado.

- Dei a você o poder necessário. - sorriu por baixo do capuz – Vai usá-lo e aperfeiçoá-lo durante os anos até que chegue a hora...

- A hora  de quê? 

- Você saberá quando vir o relâmpago e o trovão que anunciará a guerra...

            Evan calou-se um instante.

- Mas... quem é você?

- Vai saber quando for hora...

            A figura encapuzada desapareceu da forma como surgiu, feito um fantasma. Evan ficou a refletir um pouco. Viu-se refletido no para-brisa de um carro ali abandonado e, sem saber como, tinha em sua mente o que deveria fazer: pôs sua mão sobre o vidro e ele foi afundando lentamente, uma sucção leve no lado que reverso do espelho, mas não teve medo, mergulhou de vez nesse mundo ao contrário e fugiu de sua realidade mesquinha e fria. Do topo de uma colina a figura encapuzada ainda sorria.

- Muito bom, Mestre dos Espelhos.

17 anos depois.

            Barry Allen corre atrás de um ônibus que o levaria ao trabalho. Questiona-se como sempre está atrasado. Tenta sempre ser pontual, marcar compromissos em horários convenientes, mas tudo conspira para que se atrase. Teria que caminhar até a delegacia de polícia de Central City, onde fazia parte do corpo da polícia cientifica. Barry era um cara comum, sem namorada, sem vida social, sem  perspectiva. E atrasado para o serviço. Sabia que levaria bronca e teria que ficar até mais tarde para compensar seu atraso. Esse pensamento não o incomodava. Ele não tinha mais nada além desse emprego. Até a planta que ganhara dos colegas de repartição no dia de seu aniversário morrera devido a seus constantes atrasos e esquecimentos. Tinha para consigo o mesmo cuidado que teve com ela. Sem hora para comer, dormir, para sair do trabalho. Esse era Barry Allen.

- Senhor Allen, deseja uma carona?

            A voz vem de um lindo carro conversível que andava a seu lado. Barry logo a reconhece: Iris West, a repórter para quem deu alguns esclarecimentos sobre o último crime em que trabalhou. Era uma bela jovem, muito altiva e cheia de si. Mas tinha um jeito de saber enrredá-lo e conseguir dele tudo que quisesse.

- Não é necessário, senhorita. - disse sem jeito – caminhar é bom, ás vezes.

- Sim. Quando isso é por escolha.
 
            Ela riu. Barry se sentiu corar.

- E também não quero atrapalhar seu caminho... - completou ele, timidamente.

- Não vai atrapalhar. Vou pra lá mesmo.

            Barry subiu no carro, meio sem jeito, e partiu.

Keystone City. A cidade-gêmea de Central City, separadas só por uma ponte de metal. Existem grandes indústrias e comércios nas ruas de Keystone. Tudo é bem mais sofisticado que em Central City. Mas tem um motivo pra isso: Keystone é lar de um herói. Durante a segunda guerra surgiram aventureiros mascarados que combateram as ambições de Hitler e se tornaram uma lenda. Este homem era chamado de Flash. Possuía super velocidade e enfrentou incríveis personagens vilanescos. Então sumiu. Mas Keystone não o esqueceu.

            Jay Garrick foi esse homem. Hoje ele não é mais nada, além de um idoso observando luzes de alerta no horizonte e sabendo que pessoas correm perigo. Pensa por um instante em correr novamente, mas a simples possibilidade o faz desistir e sentar-se novamente, triste, na poltrona e observar às luzes pela janela.

- Que posso eu fazer? – sussurra para seu reflexo no espelho.

As luzes de alerta são provenientes da joalheria Girl’s, no centro de Keystone. Ninguém sabe como, um bandido atravessou a vidraça principal, como que surgido de dentro do espelho e começava a limpar o caixa e peças de maior valor disponíveis.

- Por favor – disse o gerente – leve tudo, mas deixe os meus funcionários vivos...

- Se liga, cara. – disse o homem – Só quero os objetos de valor. Se ninguém se meter a herói, todo mundo saí dessa inteiro. O Mestre dos Espelhos não quer ferir ninguém que não se meta a herói.

            Já era anoitecer e Barry Allen ainda trabalhava na divisão da polícia científica, apesar de saber que se parasse de trabalhar nenhum outro poderia saber. Mas Barry era assim, honesto em tudo. Apesar disso estava meio apreensivo em como iria voltar para casa. Chovia há muito, sem dar trégua em nenhum instante.

- Como vou chegar em casa desse jeito? – se perguntava. – Preciso ir pondo as coisas em ordem, se não nunca vou sair...

            Barry começa então a alocar as substâncias que utilizava em seus experimentos nas estantes de ferro próximas a janela. A chuva não cessava. Um último vidro na prateleira de cima mudaria a vida de Allen para sempre. Ele estica o braço ao máximo, mas ainda assim é difícil alcançar o local onde ele é guardado.

            Então a vida de Barry mudaria para sempre.

            Um raio atravessou a janela e atingiu a estante onde Barry se esforçava para guardar o frasco arremessando-o ao chão e todas as substâncias sendo arremessadas sobre ele, energizadas pelo raio. Barry grita. Num instante o clarão e depois nada.

            Não muito longe dali, Evan McCulloch, o Mestre dos Espelhos, observava os frutos de seu desonesto primeiro dia de trabalho em keystone City.

- Bom... – diz pra si – Keystone vai ser um bom local pra trabalhar...

            De repente algo chama a atenção de Evan: o mesmo raio que atravessou a janela de Barry e o arremessou longe fez o Mestre dos Espelhos ir à janela e prendeu sua atenção observando o brilho forte que provinha da cidade do outro lado da ponte. Ele ficou em silencio, mas este foi quebrado por um trovão assustador e tão forte que partiu as vidraças de algumas casas. 

- É o sinal... – sussurrou Evan.

            Não longe dali, no lar de Jay Garrick ele se ergue da poltrona ao ver o raio e se pergunta se alguém estaria ferido. Observa um instante, mas o que poderia fazer? Se ainda fosse um herói...

- Talvez seja esse o mal do mundo... Faltam heróis... – ele sussurra para seu coração cheio de nostalgia.
           
           
 Continua!

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